Frequentemente leio no Linkedin sobre como fazer e o que não fazer no que refere a entrevista de emprego. Com quase a mesma frequência me sinto desconfortável com o que leio. Algo não me parece certo… Por fim, consegui entender o que me incomoda tanto.
Como proprietário de meu próprio negócio, recrutamento e seleção é parte importante do meu trabalho. Minha empresa tem um número reduzido de funcionários. Portanto, uma pessoa representa muito, tem impacto e relevância significativos. Não posso cometer erros trazendo a pessoa errada. (Assim deveriam pensar mesmo os gerentes de multinacionais, pois suas equipes diretas sempre são pequenas células dentro da engrenagem corporativa.)
Imagine que um certo candidato, durante a entrevista, saiba a coisa certa a se dizer toda vez. O discurso parece não ter brechas, nem uma falha. Porta-se impecavelmente, sabe como se comportar, usa linguagem apropriada, tom de voz assertivo. Parece ótimo, certo? Bem, para mim, não necessariamente.
Sugiro que você vá até um destes “como fazer” na sua timeline do LinkedIn. Deve haver um agora mesmo. Leia o que está escrito. Se possível, vá a outro, depois a outro. Depois de ler alguns, claramente você notará um padrão. E este padrão indicará “minta e engane”, linha após linha. Como se você, entrevistado, se transformasse num personagem a ganhar vida durante a entrevista. Julga-se fazer parte de um ritual. O entrevistador quer ouvir algumas respostas – o entrevistado deverá saber quais. É um teatro, se você praticar e memorizar o texto direitinho, você estará pronto.
É este modelo de preparação total para o padrão de entrevista que eu tento quebrar quando estou buscando algum profissional para uma vaga. Normalmente, as empresas querem moldar funcionários aos seus ideais. Grandes corporações são trituradores de individualidades. No meu caso, procuro conhecer o candidato para saber se seu perfil encaixa na nossa cultura, para no fim calcular quão sinérgica é a relação. Concomitantemente, a nova geração de profissionais apresenta uma natural e violenta rejeição aos moldes impostos do mundo corporativo. Para eles, é mais difícil sentirem-se engajados uma vez que a prerrogativa é a de que devem se alinhar ao modelo desejado de funcionário-padrão. Contratar nesta nova época, portanto, significa entender os gatilhos de motivação de cada um, individualmente. O potencial máximo reside nas idiossincrasias.
A mudança na imagem percebida da empresa – e consequente engajamento do entrevistado – ocorre quando os candidatos percebem que tentar e errar nas atividades (arriscar quando se há pouca pesquisa de benchmark, situação em que a criatividade é valor fundamental) é mais relevante que “buscar o candidato certo”. Sabe aquilo “contrate o caráter, treine as habilidades”? Nesta linha. Durante minha carreira, falhei inúmeras vezes, e estou certo de que continuarei falhando repetidamente. Entrevistados são simpáticos a isso, expor a vida como ela é cria empatia, e parte do peso de estar numa entrevista é deixado de lado. Como posso eu exigir perfeição, quando ela simplesmente não existe?
Costumo começar minhas entrevistas da seguinte maneira:
“Eu preciso conhecer quem você é. Seu histórico profissional e interesses estão claros no seu currículo, mas que fique claro que vou fazer algumas perguntas aqui e ali para detectar algumas inconsistências. Uma vez mais, quem você é e uma boa relação entre a gente são mais relevantes neste momento. Serei inteiramente honesto com você e espero que a recíproca seja verdadeira. E não tente me enganar, eu conheço todos os truques.”
Nesta situação, quem força para o retorno da entrevista ao padrão tradicional quase sempre é descartado.
Muitas figuras importantes e relevantes do mundo corporativo gostam destes manuais de como proceder. Respeito e educadamente nego suas premissas. Não estou dizendo que sejam completamente sem utilidade – você pesca boas ideias eventualmente. A questão que trago é de natureza mais pessoal. Precisamos ampliar a conexão humana nas relações de trabalho. Quero gente de peito aberto, original, criativa, com jogo de cintura. Não defensores da decoreba preparatória. Para estes, sempre digo que, se eu quisesse trabalhar com atores e personagens, estaria fazendo filmes.
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E você? Qual a entrevista mais diferente de que você participou? Como se sentiu e como reagiu?
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One thought to “Uma entrevista fora do padrão funciona”
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